Clínico Geral e Médico de Família: Como conduzir pacientes com transtornos depressivo e ansioso?

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Os transtornos psiquiátricos, principalmente os transtornos depressivos e os transtornos de ansiedade, são muito prevalentes na população, e é papel do clínico geral identificar e tratar adequadamente os casos de menor complexidade, dado que são diagnósticos extremamente prevalentes e que não existem psiquiatras suficientes para tratar toda esta população. Além disso, tais condições psiquiátricas estão frequentemente associadas a outros problemas de saúde, e o clínico, quando possível, busca atender o paciente de forma integrada. Você que é clínico geral ou médico de família leia abaixo algumas diretrizes para melhor atender esses pacientes.

 

MODALIDADES DE TRATAMENTO DOS TRANSTORNOS DEPRESSIVOS E ANSIOSOS

Em primeiro lugar, você deve acolher o paciente e se certificar de que aquele quadro não está sendo desencadeado por tireoideopatias, efeitos colaterais de certas medicações (como anti-hipertensivos, imunossupressores) ou abuso de álcool e drogas.  Descartados esses diagnósticos, você tem basicamente 2 tratamentos de primeira escolha e complementares para os transtornos depressivos e ansiosos: psicoterapias e medicações antidepressivas.

  1. Tratamento não-farmacológico da depressão e ansiedade: A psicoeducação, ou seja, explicar brevemente os sintomas e a natureza multifatorial das síndromes psiquiátricas (interação gene x ambiente) consiste per se em uma estratégia valiosa no manejo da ansiedade e da depressão. Estabelecer aliança terapêutica e estar atento às necessidades afetivas dos pacientes seguramente auxiliam o clínico em sua missão de abrandar os sintomas. Além disso, é extremamente benéfico mapear, em conjunto com os pacientes, os possíveis desencadeantes ambientais e psicológicos e auxiliá-los na elaboração de um plano de intervenção. As psicoterapias consistem em tratamento de primeira escolha para ansiedade e depressão em conjunto com as medicações. Infelizmente, o acesso a elas não é irrestrito, devido a dificuldades em diversos setores de atendimentos, dificuldades financeiras ou resistência por parte dos pacientes. Em algumas situações, a psicoterapia deve ser fortemente encorajada, por exemplo, se houver distorções de autoapreciação e dificuldades na esfera dos relacionamentos. As terapias cognitivo-comportamental e psicodinâmica requerem preservação de funções cognitivas e nível intelectivo.
  2. Tratamento Farmacológico: Atualmente, existem inúmeros antidepressivos disponíveis, pertencentes a diversas classes. Apesar dos apelos da indústria farmacêutica, as evidências científicas de superioridade de antidepressivos no tratamento de ansiedade e depressão são muito escassas. Assim, a escolha dos antidepressivos baseia-se primariamente: 1) no perfil de efeitos colaterais; 2) nas indicações de tratamento de comorbidades; e 3) na experiência do médico com o antidepressivos.

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CUIDADOS NO TRATAMENTO DOS TRANSTORNOS MENTAIS

  1. Diagnosticar doenças orgânicas: Os sintomas psiquiátricos são comuns a diversas doenças orgânicas, e é fundamental excluir tais diagnósticos. História e exame físico completos, com exames laboratoriais direcionados, são fundamentais para todos os doentes. Na ausência de outras pistas, alguns exames que costumam ser úteis são hemograma (excluir anemia), TSH e T4 livre (excluir distúrbios de tireoide). Em pacientes emagrecidos com febre e sudorese noturna, devemos aventar outros diagnósticos, como neoplasia oculta ou tuberculose.
  2. Atingir a dose ideal: O receio de empregar doses adequadas talvez constitua a principal dificuldade do clínico geral no tratamento de pacientes ansiosos e deprimidos. A eliminação dos sintomas residuais e a busca pela remissão melhoram a qualidade de vida dos pacientes e evitam futuras recaídas.
  3. Estar atento a sintomas após a remissão dos sintomas depressivos ou ansiosos: Apesar da boa resposta terapêutica, transtornos ansiosos e episódios depressivos frequentemente apresentam curso crônico. Devemos estar atentos a eventuais recaídas dos pacientes. Tratamento com doses ótimas por período adequado, bem como psicoterapia de manutenção, evitam a cronicidade destes transtornos.
  4. Suspeita de transtorno bipolar: A síndrome depressiva e sintomas ansiosos podem estar presentes em pacientes com transtorno bipolar do humor (outrora denominado psicose maníaco-depressiva). Deve-se questionar ativamente sintomas maníacos e hipomaniacos, como elevação do humor, grandiosidade, aumento de energia, e desinibição de certos comportamentos, como sexual ou gastos excessivos. Antecedente familiar de bipolaridade também deve ser ativamente averiguado antes de iniciar a terapêutica antidepresiva, pois esta pode acarretar comportamento suicida e piora do prognóstico em pacientes com tal diagnóstico. Na suspeita de transtorno bipolar, sugere-se encaminhar o paciente ao psiquiatra.
  5. Evitar o uso de benzodiazepínicos: Transtornos ansiosos e depressivos frequentemente apresentam sintomas como angústia, tensão e distúrbios do sono, passíveis de melhora com benzodiazepínicos. Entretanto, o uso crônico destas medicações pode acarretar dependência, perda de memória e aumento do risco de quedas e fraturas. Sugerimos evitar estas medicações e, se for necessário, optar por benzodiazepínicos de meia-vida longa em doses baixas, como diazepam 5 a 10 mg/dia e clonazepam 0,2 a 5 mg/dia, apenas nas fases iniciais do tratamento, principalmente se o paciente apresentar uma piora inicial dos sintomas ansiosos no início do tratamento com antidepressivos.
  6. Abuso de álcool e drogas: Pacientes com depressão e ansiedade frequentemente utilizam álcool e drogas para aliviarem seus sintomas. A comorbidade com dependência de álcool e drogas deve sempre ser excluída. Além disso, a intoxicação e o uso crônico de álcool e drogas podem acarretar sintomas ansiosos e depressivos secundários ao uso. Em casos graves, sugere-se encaminhamento ao especialista.
  7. Risco de suicídio: Alguns estudos recentes evidenciam aumento do comportamento suicida em crianças e adolescentes em tratamento com antidepressivos. Estima-se que o número de suicídios aumentaria caso esses indivíduos não fossem tratados para depressão, entretanto regressões logísticas realmente evidenciam que alguns medicamentos antidepressivos podem estar implicados na gênese do comportamento suicida. Assim, recomendamos que, uma vez diagnosticadas, crianças e adolescentes com depressão sejam encaminhadas a um serviço especializado e que sejam utilizadas medicações antidepressivas com uso aprovado na infância e adolescência (fluoxetina, sertralina e fluvoxamina).

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QUANDO ENCAMINHAR AO PSIQUIATRA?

Em pacientes com ideação suicida, suspeita de transtorno bipolar ou presença de sintomas psicóticos, o ideal é encaminhar o paciente diretamente ao psiquiatra. Não se tratando de nenhum desses casos, deve-se escolher o antidepressivo mais apropriado, levando-se em conta o perfil de efeitos colaterais, custo e comorbidades clínicas. Caso o paciente ainda apresente resposta insatisfatória, ele deve ser encaminhado ao psiquiatra.

 

Artigo original: O clínico geral e o paciente psiquiátrico

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