Plantão de carnaval: como cuidar do paciente com intoxicação alcoólica?

O conteúdo a seguir é de autoria de Ronaldo Gismondi, médico e colunista da PEBMED. O artigo original pode ser lido aqui.
Depois de ser ingerido, o álcool leva apenas 10 minutos para começar a ser absorvido. De 30 a 90 minutos após a ingestão, acontece o pico da concentração plasmática. E, visto que o metabolismo hepático retira apenas 15-20 mg/dl/h, qualquer ingestão acima desses valores provocará intoxicação.
As primeiras manifestações do álcool são aquelas alterações comportamentais que muitos já experimentaram. Entretanto, o grande perigo da ingestão de álcool está nos exageros, quando o rebaixamento do nível de consciência é tão grande, que o indivíduo precisa sair “carregado” da festa. Nesses casos, é muito comum a ocorrência de vômito, broncoaspiração e hipoxemia. Além disso, cardiopatas estão sob risco de efeitos deletérios diretos, como as arritmias cardíacas.
Em época de carnaval, a frequência de intoxicação alcoólica nos plantões aumenta. E o desafio para o médico é cuidar de um paciente desacordado, cujos amigos provavelmente também não estejam em condição de fornecer histórico.
Então… o que fazer? Por onde começar? Primeiramente, você deve dividir o atendimento em dois caminhos paralelos:
- Suporte dos sinais vitais – via aérea, oxigenação e circulação;
- Obter mais informações com familiares/amigos.
Tabela 1: avaliação do paciente com intoxicação alcoólica aguda
Sinais trauma: o paciente bêbado tem maior risco de quedas e acidentes. | Uso outras drogas: em especial, os depressores, como heroína e benzodiazepínicos, pois potencializam os efeitos do álcool. |
Medicações uso recente. | Vômito: muito comum, é potencial causa de broncoaspiração → hipoxemia → PCR. |
Comorbidades, em especial cardiopatia. | Olho nas pupilas! No paciente pouco cooperativo, pode ser a dica para lesão estrutural e déficit focal. |
Na avaliação inicial (tabela 2), colete laboratório com hemograma, bioquímica e hepatograma. Faça glicemia capilar imediatamente. Se houver sinais focais ou história de trauma, tomografe crânio e cervical; uma radiografia de tórax também entra na lista.
Tabela 2: manejo do paciente bêbado
Laboratório com hemograma, glicose, ureia, creatinina, sódio, potássio, TGO, TGP, FAL GGT, bilirrubina, proteína total e frações, TAP, PCRt |
Faça glicemia capilar imediatamente |
Se houver trauma ou sinal focal faça TC crânio e cervical |
Cristaloide 20ml/kg |
Reposição tiamina |
Antieméticos |
E o tratamento? Hidratação o principal. Use cristaloide, bolus inicial 10-20 ml/kg e depois 20-30 ml/kg/24h. Acrescente glicose no soro, mínimo de 100 g (400 kcal). Ao contrário de outras intoxicações exógenas, a lavagem gástrica é pouco útil, dada a rápida absorção do álcool.
A reposição de tiamina é mais importante no alcoólatra e deve ser feita antes da infusão de glicose (100 mg parenteral ou 300 mg oral). Na pessoa hígida, que só bebeu demais no Carnaval, essa reposição não é tão necessária.
Drogas antieméticas como metoclopramida ou ondansetrona são ótimas para reduzir o risco de vômito. E, se o paciente persistir vomitando, um decúbito lateral direito (posição de segurança) ajuda.